Quem escreve sobre viagens, sabe que é tão difícil como escrever sobre ciência, atualidade, desporto ou outro tema.
Houve um tempo em que os artigos sobre viagens estavam apenas em revistas de luxo ou livros magníficos. Eram textos de tal forma envolventes que nos transportavam para aqueles lugares onde nunca tínhamos estado.
As nossas próprias histórias e a vontade de inspirar outros motivaram muitos de nós a lançarem-se no mundo da escrita. O Travel Random Notes nasceu precisamente de duas grandes paixões: viajar e escrever.
O desafio que se impõe é envolver os leitores nessas histórias, motivá-los a partirem, a conquistarem mundo. Como é que, através da simples combinação de palavras, conseguimos lá chegar?
Não sei se foi o caso de todos os bloggers mas, no início, os textos saíam-me a muito custo, simples, desapaixonados. Nas minhas palavras não brilhavam as emoções que o destino tinha suscitado em mim. Mas não desisti, continuei a escrever e, não satisfeita, fui à procura de inspiração.
As melhores e as mais óbvias fontes de inspiração são efetivamente os livros. São eles a musa e os professores de todos os que escrevem. A primeira coisa que devemos fazer para melhorar as nossas habilidades de escrita é ler muito! Ler histórias e artigos escritos por bons escritores. Ler e absorver. E não apenas livros de viagem.
A resposta para enriquecermos as nossas histórias reside, muitas vezes, em livros menos óbvios. Até podemos não gostar do autor, da obra ou da história, mas a escrita, a forma como se descreve locais e acontecimentos é uma fonte de inspiração.
Livros e autores para procurar inspiração:
Isabel Allende
As suas histórias vividas são como um novelo, que vai sendo desenrolado de uma forma subtil, mantendo-nos presos. A autora chilena consegue transportar os seus leitores para as épocas, locais e vidas atribuladas das suas personagens.
O melhor livro para começar talvez seja a Casa dos Espíritos, obra que percorre a história da família Trueba ao longo de quase um século. O livro mistura, de forma brilhante, ficção com a realidade da revolução chilena, mantendo sempre uma pitada de mistério.
Depois de ler o livro, não consegui deixar de sonhar com o Chile. Tive vontade de seguir as pisadas das personagens. É este o impacto que, penso, todos devemos aspirar a ter nos nossos leitores.
Jack Kerouac e Paul Theroux
Esta lista tinha que incluir dois dos nomes maiores da escrita de viagem: Kerouac e Theroux. Ambos escreveram várias obras literárias, sendo que recomendo três que considero as mais icónicas.
Em On the Road e Lonesome Traveler, Kerouac transforma os seus leitores em companheiros de roadtrip. O primeiro é a compilação de um conjunto de crónicas autobiográficas do autor, onde ele relata as viagens pela América. É um excelente desbloqueador criativo, acreditem!
Em Lonesome Traveler, Kerouac relata uma grande viagem, partindo dos Estados Unidos, até Londres, passando por Marrocos. É uma obra clássica onde podemos sempre voltar, em busca de inspiração.
Paul Theroux é o responsável pela minha paixão por viagens de comboio. No seu Livro mais conhecido, The Great Railway Bazaar, relata uma viagem de comboio entre Londres e Tóquio.
Recomendo-o não só pelo relato prodigioso da viagem, mas também pela forma como inclui, no percurso e na história, os passageiros com quem se vai cruzando. Nas viagens conhecemos pessoas que enriquecem a nossa experiência e que podem ser fundamentais para abrilhantar as nossas crónicas.
Theroux é exímio na forma como inclui os outros na história, transformando-os em protagonistas. Para mim, é um dos mais completos livros de viagem de sempre.
Autores portugueses: Camilo Castelo Branco, Eça de Queiroz e Fernando Pessoa
Em Portugal também há vários autores clássicos que nos podem servir de inspiração, pela sua escrita rica e cheia de imagens. Camilo Castelo Branco e Eça de Queiroz são dois exemplos.
Viagens na minha Terra foi o primeiro “guia de viagens” que me lembro de ler. Em alguns momentos, é demasiado descritivo e visual (por isso não é uma “inspiração” consensual). Mas Eça sabe como ninguém transportar-nos para dentro das suas histórias, como se estivéssemos num simulador de realidade virtual. A forma como ele descreve as casas, os locais e as pessoas é um excelente exercício de criação de imagens mentais através das palavras.
Os Maias são outro exemplo, mas existem sempre hipóteses mais curtas como O crime do Padre Amaro. Não podia faltar nesta lista Fernando Pessoa e o seu Lisboa, O que o turista deve ver. Lê-se num dia, guarda-se para sempre. É um guia de viagem escrito em inglês com as principais atrações da “sua” cidade, escrito como se fosse uma carta de amor a Lisboa.
Heidi de Johanna Spyri
Sendo um livro para crianças, provavelmente, não é uma escolha muito óbvia. No entanto, quem já o leu de certeza que ainda recorda as descrições da autora. Spyri leva-nos, através das palavras, para os locais onde Heidi e Pedro vivem tantas aventuras: a casinha isolada do avô, perdida num planalto nos Alpes, as paisagens esplendorosas de vales e montanhas, as pastagens, a cidade de Frankfurt.
Dan Brown
Milhões de pessoas foram cativadas pelas suas histórias e pelas viagens do professor Robert Langdon para desvendar os mais variados segredos. O ritmo da narrativa mantém-nos presos, capítulo após capítulo.
As descrições das cidades (Paris, Londres, Istambul, Edimburgo, Veneza, Vaticano, Roma) quase nos permitem visualizar, de olhos fechados, os locais por onde vai passando o protagonista. Já para não falar que, no meio de toda a ficção, existem sempre dados históricos, culturais e sociais interessantes.
Existem milhares de obras que nos podem inspirar. De viagens, de ficção, de história. De certeza que cada um tem as suas. Que obras vos inspiram a escrever?