A “bloguinha” dos ovos de ouro. Qual é o teu preço?

Quanto vale o trabalho de um blogger de viagens é tema tão pertinente quanto polémico nos dias de hoje.

Que valor deve um blogger incutir no seu trabalho, sendo ele próprio uma ferramenta de publicidade para entidades e empresas?

Não me vou focar em como fazer dinheiro com o blog. Quero antes refletir sobre como evitar cair na tentação de nos vendermos, em troca de dinheiro ou de coisas que não precisamos. Falo de valor humano.

Para esta reflexão importa analisar as seguintes perspetivas:

  • Ter um blog para partilhar informação de viagens;
  • Ter um blog para ganhar dinheiro;
  • Ter um blog para partilhar informação de viagens e ganhar dinheiro.

Os diferentes focos revelam a complexidade e a subjetividade do assunto. Temos, logo à partida, três maneiras diferentes de encarar o mesmo assunto.

Na última década, muitos blogs de viagens surgiram por puro interesse financeiro. A procura de um sustento online superou a procura de um trabalho convencional, praticamente a regra até então.

Quando comecei a viajar, pagava as minhas aventuras com o fruto de vários empregos temporários: dei aulas, trabalhei numa loja de fotocópias, fui empregado de mesa, etc. Juntava dinheiro para viajar e voltava sempre a casa com a conta bancária a zeros.

A partilha de informação na Internet começou com o objetivo de motivar outras pessoas a viajarem. Não havia segundas intenções.

Ganhar dinheiro. A que preço?

Hoje, o mercado mudou. Mudou também o entendimento sobre o potencial da Internet e dos blogs, originando uma avalanche de blogs de viagens, encarados como fontes de rendimento e de financiamento para outras viagens.

É fantástico vivermos numa época em que existem formas alternativas de ganhar dinheiro. Conceber um projeto e realizá-lo é cada vez mais fácil, e o mérito é, acima de tudo, dos que conseguem idealizá-lo.

Para aqueles que se dedicam a um blog de viagens a tempo inteiro, é relativamente fácil começar a ter rendimento com essa atividade, a partir de publicidades pagas, comissões de vendas de determinados produtos, artigos patrocinados, banners e postagens publicitárias nas redes sociais.

Mas é importante que o blogger seja genuíno e não se limite a vender aquilo em que não acredita, que nunca usou ou que não lhe suscita interesse algum.

Ou seja, ganhar dinheiro com um blog de viagens é uma excelente oportunidade, não nos devemos sentir mal com isso. Mas há circunstâncias que exigem uma reflexão profunda.

Reflexão essa que deve considerar:

  1. Qual a razão de partilharmos um determinado produto, destino, hotel, ou agência de viagens?
  2. Estamos a influenciar falsamente o leitor, só porque fomos pagos para tal?
  3. Será correto aceitar alguns trabalhos só porque fomos pagos?
  4. Será correto não aceitarmos alguns trabalhos só porque não somos pagos?
  5. Terá um influenciador responsabilidade social naquilo que faz?
  6. Em quem devemos pensar primeiro? Em nós, no leitor ou em quem nos contrata?
  7. Será que fazer das viagens um trabalho não deturpa o conceito de viajar pelo prazer de conhecer, explorar, descobrir?

Estas perguntas caem puramente na ética individual. Há sempre um valor mais alto do que o dinheiro. Há algumas coisas que o dinheiro nunca poderá comprar.

Pensar bem antes de escolher

Quando se tem um blog de sucesso, é comum sermos contactados por marcas que pretendem publicitar os seus produtos. As empresas mais ambiciosas enviam o produto gratuitamente e pagam por um review e/ou divulgação nas redes sociais (em texto, vídeo ou fotografia).

Quero partilhar um exemplo pessoal, relativamente a uma marca de relógios e óculos. Eu nunca usei relógio, mas aceitei fazer parte de uma campanha publicitária de algo que não preciso nem uso. Ou seja, pus na cabeça que iria começar a usar relógio só porque mo enviaram e, além disso, seria pago para tal.

Depois de alguma ponderação, rescindi o contrato inicial e não recebi a última parcela do pagamento. Ou seja, abdiquei da tentação consumista de usar algo, só porque posso e mo ofereceram. É o mesmo que ir a um supermercado e comprar tudo, só porque temos dinheiro para isso.

Escrever num blog com princípios pré-definidos não é fácil. Fazer uma avaliação honesta sobre algo (evento, local, produto) pelo qual fomos pagos pode mesmo ser uma tarefa difícil.

Obter rendimento com o blog é bom. Mas teremos de definir regras e limites de ética na nossa prática.

Por isso vamos lembrar:

  • O leitor precisa?
  • Precisamos nós?
  • Ou precisa a empresa contratadora?

Em resumo, é primordial estabelecermos uma relação ética e duradoura: com nós mesmos, com os nossos seguidores e leitores.

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Ana C. Borges
Ana C. Borges

Gosta de passeios longos e conversas intermináveis, de ver o que ainda não conhece e rever os lugares do coração. Fotografa para memória futura. Escreve porque lhe sabem bem as palavras. Viaja por paixão – e porque o mundo é demasiado grande para ficarmos quietos. É autora do blogue Viajar porque sim.

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