A viajante dos sete ofícios: Lígia Gomes (entrevista)

Nome: Lígia Gomes

Profissão: Já usei vários chapéus. Embora seja farmacêutica de formação e já tenha trabalhado na indústria farmacêutica, também fui copywriter numa agência de publicidade, trabalhei em marketing digital, como responsável da equipa de conteúdo e community manager numa start-up, dei aulas, fui diretora-geral de uma empresa americana de viagens para nómadas digitais. Recentemente decidi abraçar o trabalho remoto; faço customer support para uma start-up australiana. Assim, posso trabalhar e viajar ao mesmo tempo.

Data de nascimento: 1985

Local de nascimento: Loulé

Local de residência: Lisboa

Próximas viagens: Tenho tendência de marcar sempre tudo de um dia para o outro. Go with the Flow.

Blog: A Crush On

1. O que significam as viagens para si?

Um estilo de vida. A minha vida. O meu espaço de felicidade. Só me sinto realmente eu quando estou em trânsito e a sair do conforto da minha casa. É uma sensação de descoberta constante e isso fascina-me. Adoro aprender com novas culturas às quais nunca estive exposta, porque é nessa colisão que se produz conhecimento e se engrandece o amor pelo nosso magnífico mundo. É nessa colisão que se aprende a respeitá-lo ainda mais. E é também aí que sinto como gosto de casa. A música do António Variações “Estou Além” assenta-me que nem uma luva.

Pequeno monge em Myanmar

2. Entre os destinos que já visitou, há algum que a tenha marcado de forma especial? Conte-nos.

A Índia foi provavelmente o ponto de viragem na minha relação com as viagens. Foi a minha primeira grande viagem: quase um mês de mochila às costas, numa altura onde o telemóvel e a internet não eram omnipresentes. Foi um grande choque cultural.  A partir daí, senti que o mundo é a minha casa porque, embora me sinta sempre impelida a novos encontros com o desconhecido, já não o temo.

3. O que mais a influencia na hora de escolher um destino de viagem?

Não tenho uma linha condutora, depende de quanto tempo tenho disponível, do orçamento, da altura do ano ou da companhia. Tento sempre ir onde ainda não fui; só penso em repetir uma cidade se realmente existir uma razão muito específica. Importante frisar que falo em cidades e não em países. Se pensarmos no nosso país, Lisboa, Porto ou Algarve são sítios completamente diferentes.  Uma coisa que gosto é de bom tempo – lido muito mal com o frio – e de sítios com alguma carga cultural.

4. Já viveu fora de Portugal mais que seis meses? Se sim, onde e o que retirou dessa experiência?

O meu limite foi seis meses, quando estive em Erasmus na Grécia. Como fui sozinha e não conhecia ninguém, obrigou-me a ter mais iniciativa e conhecer novas pessoas, característica que me acompanhou desde então.

Os lindos azulejos de Lisboa

5. Explique o que é o seu blog de viagens e a razão da sua existência.

O blog começou porque os amigos me pediam recomendações após as minhas viagens, idas a restaurantes, festivais… de tudo um pouco. Um dia lembrei-me que, se as escrevesse, seria muito mais fácil. Só teria de enviar um link, sempre que me pedissem. Assim foi. Este detalhe, aliado ao gosto pela escrita, tornou o processo muito prazeroso e passou a fazer parte dos meus dias.

6. Como surgiu o nome do blog?

“A Crush On” significa ter um sentimento amoroso por alguém, especialmente alguém que não conhecemos bem. O meu “alguém” são as coisas que vou descobrindo e o mundo que vou encontrando. Uma amiga sugeriu o nome, inspirada no facto de eu gostar de muitas coisas diferentes, ter vários crushes, em vez de uma única paixão.

7. Destaque um dos posts de que mais gosta no seu blog e explique porquê.

Sem dúvida o post sobre Couchsurfing num mosteiro em Myanmar. Foi uma decisão que tinha tudo para correr mal e que forçou uma aprendizagem imensa.

“Lemos que na Birmânia não era permitido que os turistas ficassem em casas particulares e que, legalmente, deveríamos pernoitar sempre num hotel. Algumas respostas de couchsurfers explicavam esta questão. Não ficámos contentes com este desfecho. Decidimos arriscar na aleatoriedade. Procurámos couchsurfers no país inteiro. Em 676.578 km² certamente alguém nos iria receber. Se alguém nos respondesse positivamente, alteraríamos os planos de viagem e tentaríamos passar por lá. Assim foi. Um monge chamado Uvi Seitta acedeu a receber-nos no seu mosteiro e decidimos fazer o desvio para conhecer esta realidade e descobrir Meiktila.”

Madagáscar
Numa aldeia em Madagáscar

8. Alguma dica para quem pretende começar agora um blog de viagens?

Façam-no porque gostam – isso é o mais importante. Pensem qual é a plataforma certa para vocês. Embora ame escrever, nem sempre tenho tempo e, para não me desmotivar, tenho explorado com bastante entusiasmo a criação de conteúdos no Instagram, graças à possibilidade de aprender mais sobre imagem e vídeo.

Fazer uma story é mais fácil que escrever um artigo. Será apenas essa a razão? Não. Também é porque sou super exigente com a minha escrita e, normalmente, detesto o que escrevo quando não tenho o tempo necessário para lhe dedicar. Tentem não ser como eu. Sejam menos exigentes. Ponham cá para fora aquilo que sentem.

9. Que papel desempenham os blogs junto de outras pessoas que gostam de viajar?

Embora hoje em dia seja muito mais fácil viajar, ainda há muita gente que nunca o fez, ou nunca saiu do seu continente. Quando as pessoas decidem dar um salto maior, precisam de sentir que um ser humano normal (e não uma estrela de televisão ou figura pública) já o fez, que passou por uma experiência semelhante. Penso que, mais do que dar conselhos e dicas de viagem, damos segurança e mostramos que é possível.

Para os mais aventureiros também somos importantes, porque muita coisa que escrevemos nos nossos blogs não estão nos guias mainstream. As pessoas gostam de sentir que estão a viver o desconhecido do desconhecido.

Vendedores de baozi, na China

10. Qual é o seu maior sonho por cumprir?

Depois de algumas viagens, decidi voltar a estudar. Escolhi Antropologia, para entender melhor as diferentes culturas e comunidades. Isso abriu-me os horizontes, mostrou-me outras dimensões existentes no turismo e na viagem. Para além disso, fiz uma pós-graduação de Desenvolvimento e Cooperação Internacional.

Sonho fazer algumas viagens focadas em projetos de cooperação que as grandes instituições promovem, para entender o seu impacto. Noutra ótica, gostava de fazer uma incursão mais prolongada para divulgar com mais fundamento os problemas que certas comunidades têm de superar.

Para além disso, focar-me sobre como fazer turismo de um modo sustentável e que respeite o nosso planeta. No fundo, trabalhar mais a viagem sustentável e solidária.  Sinto que só conseguiria fazer isto com apoios e se vivesse do blog. Por isso permanece ainda um sonho.

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Ruthia Portelinha
Ruthia Portelinha

Viajante, mãe babada, chocólatra, amante de livros e museus.
Autora do blog O Berço do Mundo.

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